Já perdi a conta de quantas vezes uma nova paciente entrou no consultório e, antes mesmo de sentar, começou a desfiar a lista do que está usando no rosto. Sérum disso, ácido daquilo, hidratante comprado pela influenciadora, mais um protetor solar que a prima indicou e um sabonete “milagroso” que ela mesma achou que combinava com a pele. Quando pergunto quem recomendou tudo isso, a resposta mais comum ainda me preocupa: “Ah, fui eu mesma… vi na internet”.
A automedicação dermatológica virou hábito. Silenciosa, às vezes sutil, quase sempre disfarçada de cuidado ou praticidade. Mas o que parece inofensivo pode, aos poucos, desencadear um efeito rebote, uma irritação crônica, um desequilíbrio que nem sempre é fácil de corrigir.
A pele não é um campo de testes. Ela é um órgão sensível, dinâmico, que carrega não só nossas características genéticas, mas também tudo que vivemos. Ela sente o estresse, responde aos hormônios, reflete nossa alimentação, nosso sono, nossas emoções. Quando passamos produtos sem critério, sem diagnóstico, sem respeitar o tempo da pele, a gente não está cuidando — está tentando controlar o que nem entendemos direito.
E não se trata de demonizar quem faz isso. Pelo contrário. Eu entendo. Vivemos uma avalanche de informações, promessas tentadoras, antes e depois impressionantes e uma cultura de resultados imediatos. É fácil se perder. É fácil cair na ideia de que, se funcionou para alguém, vai funcionar para mim. Mas pele não é receita de bolo. O que ela precisa hoje talvez não seja o que precisará amanhã.
Já acompanhei casos de manchas agravadas por uso incorreto de ácidos, de peles sensibilizadas por excesso de esfoliantes, de acne causada por produtos “oil free” que não eram adequados. E o mais comum: pessoas frustradas, cansadas de tentar resolver sozinhas algo que poderia ter sido abordado de forma muito mais simples e eficaz com orientação.
Mais do que indicar produtos, minha missão como dermatologista é educar. Ensinar que menos é mais. Que entender a pele é o primeiro passo antes de cuidar dela. Que rotina de skincare não se compra em farmácia ou no feed de alguém — ela se constrói com diagnóstico, com escuta, com acompanhamento.
Se você se reconhece nesse texto, está tudo bem. Não é sobre culpa, é sobre consciência. Talvez seja hora de esvaziar a prateleira e começar de novo, com calma, com critério e com alguém que te ajude a entender sua pele de verdade. Porque o melhor cuidado ainda é aquele que respeita quem você é.
Cíntia Procópio é dermatologista, especialista em rejuvenescimento com naturalidade. CRM: 5156 / RQE 2711