Conteúdo/ODOC - A Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso anulou a condenação do advogado Nauder Júnior Alves Andrade e determinou sua soltura. Ele havia sido condenado pelo Tribunal do Júri, em 30 de junho, a 10 anos de prisão em regime fechado pela tentativa de feminicídio contra a então namorada, em 2023, em Cuiabá.
Os desembargadores seguiram por unanimidade o voto do relator, Wesley Sanchez Lacerda, durante sessão realizada nesta semana.
No voto, o relator apontou que o veredicto dos jurados teria sido manifestamente contrário às provas do processo, o que exige um novo julgamento.
Segundo o relator, o depoimento da vítima em plenário deixou claro que o próprio réu interrompeu voluntariamente as agressões antes que o crime se consumasse, sem ação de terceiros ou qualquer impedimento externo.
“Embora não se conheça, com exatidão, o motivo da interrupção, o que se extrai da narrativa da vítima é que a desistência partiu, de forma voluntária, do próprio apelante”, escreveu o desembargador.
Para o magistrado, as provas demonstraram que Nauder poderia ter continuado com a agressão até um resultado fatal, mas optou por parar. Ele destacou ainda que, na garagem onde tudo aconteceu, estavam apenas o réu e a vítima.
“O fato de o apelante, no curso das agressões, verbalizar ameaças ou intenção homicida não impede o reconhecimento da desistência voluntária se, posteriormente, por ato próprio e consciente, interrompe a execução”, ponderou.
O relator apontou que os jurados responderam “sim” ao quesito que afirmava que o crime não se consumou por circunstâncias alheias à vontade do réu, como se a vítima tivesse conseguido se esquivar ou fugido com ajuda de terceiros.
Para Lacerda, isso contradiz o depoimento da própria vítima, que afirmou que o agressor parou sozinho e se afastou, o que possibilitou que ela buscasse socorro.
“Em nenhum momento a vítima declarou que se esquivou”, frisou o desembargador.
Diante da divergência entre o que foi provado e o que os jurados decidiram, o Tribunal considerou que a soberania do Júri não é absoluta e permite intervenção quando há clara desconexão com as provas.
Assim, decidiu-se pela anulação do julgamento e pela determinação de um novo júri, nos termos do Código de Processo Penal.
Com a anulação, o TJ determinou a soltura imediata de Nauder, mediante medidas cautelares: uso de tornozeleira eletrônica; proibição de se aproximar da vítima a menos de 500 metros; proibição de contato por qualquer meio; proibição de frequentar bares e boates; comparecimento obrigatório a todos os atos processuais.
O caso
O crime ocorreu em 18 de agosto de 2023, em um condomínio de Cuiabá. Segundo o Ministério Público Estadual (MPE), Nauder tentou matar a namorada após um episódio de agressões prolongadas.
Eles estavam juntos havia 12 anos em uma relação marcada por conflitos e comportamento violento do réu, que seria usuário de entorpecentes.
Por volta das 3h da madrugada, após suposto uso de drogas no banheiro, o advogado teria tentado manter relações sexuais com a vítima. Diante da recusa, passou a agredi-la com socos e chutes, impediu que ela deixasse a casa e usou até uma barra de ferro para golpeá-la e enforcá-la.
A vítima desmaiou e, ao recobrar a consciência, aproveitou um momento de distração do agressor para fugir, buscar ajuda e ser levada ao hospital.
Segundo o médico que a atendeu, “ela não morreu por ser forte, ou algo sobrenatural explica sua sobrevivência”.