Ao longo do desenvolvimento do capitalismo, a trajetória do mundo corporativo mudou e com ele, também as relações de trabalho, as expectativas das pessoas e as responsabilidades das organizações. A saúde mental no ambiente profissional, que antes era ignorada, silenciada ou considerada secundária, hoje se tornou absolutamente central, visível e, sobretudo, inegociável.
A gestão de saúde vem sendo incorporada às novas formas de gestão, e cuidar de pessoas deixou de ser um diferencial para se tornar essência do trabalho contemporâneo. Se você é empreendedor, empresário, gestor ou ocupa qualquer papel de liderança, é fundamental compreender que saúde mental não é acessório, não é benefício extra, não é luxo corporativo. Trata-se de uma demanda estrutural que impacta diretamente o presente e o futuro de qualquer organização.
Os fatores psicossociais no trabalho, aqueles que adoecem sem que possamos ver, estão em toda parte: carga emocional e profissional excessiva, metas abusivas, falhas na comunicação, ausência de reconhecimento, ambientes tóxicos, assédio, instabilidade e insegurança.
Surge, então, uma questão fundamental: quais as relações entre a saúde mental do trabalhador e as demandas organizacionais, especialmente aquelas que exigem produtividade, agilidade, perfeição e criatividade constantes?
Diversos autores discutem essa problemática. Para Christophe Dejours (1992), referência nos estudos de psicodinâmica do trabalho, o sofrimento psíquico nasce da tensão entre as exigências de produtividade e a impossibilidade de atender plenamente às demandas organizacionais.
Já Robert Karasek (1979), com seu modelo de “Demanda-Controle”, demonstra que ambientes com altas exigências e baixo poder de decisão são propícios ao estresse ocupacional, aumentando riscos de adoecimento. Além deles, Richard Sennett (2006) argumenta que a lógica da flexibilidade e da competitividade permanente corrói vínculos, gerando insegurança e desgaste emocional.
Nesse sentido, o estresse ocupacional pode ser compreendido como uma doença socialmente construída, fruto da pressão excessiva, da instabilidade e da competitividade desenfreada. Isso não apenas compromete a saúde e a produtividade dos colaboradores, mas também prejudica a própria organização, que arca com afastamentos, rotatividade elevada e enfraquecimento de sua cultura.
O que antes era visto como cuidado opcional hoje se impõe como responsabilidade estratégica das empresas. Saúde mental é gestão. É planejamento. É estratégia. É pensar em pessoas.
Mas é preciso clareza: construir uma cultura organizacional saudável não significa criar espaços de conforto absoluto, onde não haja metas, responsabilidades ou desafios. Pelo contrário, trata-se de desenvolver ambientes de equilíbrio, respeito, diálogo e segurança emocional. Espaços onde as pessoas sejam estimuladas, sim, mas com suporte, clareza, propósito e sentido.
Empresas que compreendem essa lógica prosperam: crescem, retêm talentos, inovam e geram resultados sustentáveis. Do mesmo modo, profissionais que assumem responsabilidade por sua trajetória, pelo desenvolvimento contínuo e pelo compromisso coletivo também avançam e prosperam.
A nova NR-1, que inclui diretrizes sobre saúde mental organizacional, aponta justamente para esse caminho. Ela estabelece que não se trata apenas de preservar produtividade ou garantir bem-estar isolado, mas de construir relações de trabalho mais justas, conscientes e humanas.
O que está em jogo, portanto, é muito mais do que uma disputa entre empresas e colaboradores. O futuro não é sobre um lado vencer, mas sobre caminhar juntos. Quando organizações escolhem cuidar e trabalhadores escolhem se comprometer, constroem-se ambientes mais fortes, mais humanos e mais preparados para os desafios de um mundo em constante transformação.
Humberto Baccin - Advogado, Empresário e CEO do Centro de Reabilitação Psicossocial - Creap