A cobrança abusiva de metas e episódios de constrangimento no ambiente de trabalho levaram a Justiça do Trabalho em Mato Grosso a condenar uma multinacional do setor de alimentos a pagar indenização por dano moral a uma ex-empregada diagnosticada com síndrome de burnout.
A decisão, da 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso (TRT/MT), manteve a sentença da Vara do Trabalho de Nova Mutum, que reconheceu a patologia apresentada pela trabalhadora como doença ocupacional e fixou em R$ 25 mil a compensação pelo dano.
Contratada como extensionista em outubro de 2022 para atuar no setor de frango de corte da unidade da empresa em Nova Mutum, a trabalhadora foi diagnosticada com a síndrome de esgotamento profissional em abril de 2024, após sucessivos episódios de cobrança abusiva, exposição pública e hostilidade no ambiente de trabalho.
Ela relatou ter sido submetida a metas inatingíveis, pressão constante, gritos e ameaças de demissão, além da exposição dos resultados em grupos de WhatsApp. Uma das testemunhas confirmou que as metas eram cobradas de forma vexatória, com listas que identificavam quem havia atingido e quem havia falhado nos objetivos, o que gerava constrangimento coletivo.
A mesma testemunha descreveu a existência de uma gestão “opressora e desigual”, em que a extensionista era frequentemente impedida de se manifestar nas reuniões, interrompida pela gerente e tratada de forma mais severa do que outros empregados. Em uma das ocasiões, a superior chegou a bater na mesa e gritar, dizendo que, se a trabalhadora não estivesse satisfeita, deveria “pedir para sair e trabalhar em outro lugar”.
Segundo laudo pericial elaborado por uma psiquiatra, o ambiente de trabalho contribuiu em 70% para o adoecimento. A perita apontou que “as condições laborais da reclamante foram concausas para o agravamento da Síndrome de Burnout, considerando o ambiente de alta pressão, a sobrecarga de trabalho e a falta de suporte estrutural”.
Embora tenha reconhecido uma vulnerabilidade prévia da trabalhadora a sintomas ansiosos, a especialista apontou que “o ambiente de trabalho contribuiu significativamente para o agravamento do quadro clínico”.
O laudo concluiu que as condições vivenciadas “indicam sofrimento psíquico significativo relacionado ao ambiente laboral, com sintomas compatíveis com transtornos de ansiedade e estresse ocupacional”.
A sentença, mantida pelo Tribunal, destacou que é dever do empregador garantir um ambiente de trabalho saudável física e psicologicamente, conforme a Constituição Federal, a CLT e as Convenções 155 e 187 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
O juiz ressaltou o potencial lesivo das práticas adotadas pela empresa, especialmente a exposição pública de metas não atingidas, classificando-as como “procedimentos que configuram um ambiente de trabalho intimidador, opressivo e lesivo à imagem e à dignidade dos empregados”.
A decisão também citou a Norma Regulamentadora 17, que proíbe métodos que causem assédio moral, medo ou constrangimento, incluindo a exposição pública de avaliações de desempenho.
Ao recorrer da sentença, a empresa não negou a doença, mas alegou ausência de nexo com o trabalho e inexistência de culpa. O relator do recurso, desembargador Aguimar Peixoto, rejeitou os argumentos, destacando a comprovação do nexo de concausalidade entre a doença e o trabalho, com base no laudo pericial. “A perita concluiu que as condições em que se dava o labor colaboraram para a debilitação da saúde mental da autora, culminando em Síndrome de Burnout”, afirmou.
Acompanhando o relator, os desembargadores da 2ª Turma concluíram ter ficado comprovado um padrão reiterado de perseguição à trabalhadora, que era cobrada de forma diferenciada, impedida de se manifestar nas reuniões e submetida a pressão desproporcional para atingir metas, quando comparada aos demais extensionistas.
Esse contexto, ressaltaram os magistrados, gerou constrangimento, isolamento e inferiorização, com repercussões comprovadas na saúde e na dignidade da trabalhadora, que precisou se afastar por recomendação médica. “O empregador deve proporcionar um ambiente laboral equilibrado não só do ponto de vista físico, mas também emocional e psíquico, o que não se verificou na hipótese dos autos”, afirmou o relator.
Com esta conclusão, por unanimidade, a 2ª Turma confirmou o valor da indenização em R$ 25 mil, considerando a gravidade das condutas e a extensão do dano.