Diário do Rio - Pelo menos 15 membros do Comando Vermelho (CV) de Mato Grosso estariam escondidos em favelas do Rio de Janeiro, pagando até R$ 80 mil mensais para garantir abrigo e proteção em territórios dominados pelo tráfico. As informações são do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), do Ministério Público de Mato Grosso, que identificou a migração contínua de lideranças da facção para o Sudeste. Com informações da Folha de São Paulo.
Segundo as investigações, o pagamento é feito em parte com dinheiro — cerca de R$ 50 mil — e o restante com fuzis avaliados entre R$ 20 mil e R$ 30 mil. Somente neste ano, 16 armas de grosso calibre foram enviadas ao Rio por integrantes do CV mato-grossense, transportadas de carro ou até de ônibus, com destino a comunidades como Rocinha, Vidigal, Penha e Complexo do Alemão, consideradas áreas seguras para foragidos.
Os dados foram obtidos a partir de celulares apreendidos em operações e prisões. “Eles foram para o Rio porque aqui a polícia entra em qualquer lugar. Lá, não. É um território dominado, como a Faixa de Gaza — o Estado não tem soberania”, afirmou o promotor-chefe do Gaeco, Adriano Roberto Alves.
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro informou que as forças estaduais atuam de forma permanente no combate ao crime organizado e mantêm cooperação com outros estados. A pasta destacou ainda que participa das reuniões do Conselho Nacional de Secretários de Segurança Pública, trocando informações e desenvolvendo estratégias conjuntas.
“Durante a Operação Contenção, cerca de 100 criminosos foram presos e outros 117 neutralizados. Dentre eles, 62 são de outros estados, incluindo um do Mato Grosso”, informou o órgão.
Atualmente, o Comando Vermelho é a maior facção criminosa em atividade em Mato Grosso, com cerca de 10 mil integrantes e movimentação estimada em mais de R$ 1 milhão por mês. O grupo surgiu na Penitenciária Central do Estado, em 2013, e hoje domina cerca de 95% das cidades do estado, com resistência apenas na região norte, onde ainda há influência do Primeiro Comando da Capital (PCC).
As conexões entre as bases do CV em Mato Grosso e no Rio envolvem troca de abrigo, armas e influência territorial. “Eles mandam fuzis e drogas em troca de refúgio. É uma relação de parceria e dependência. Pagam caro por essa proteção e continuam mandando no tráfico à distância”, afirmou o promotor.
Três dos 15 foragidos são apontados como líderes da facção. O principal é Jonas Souza Garcia Júnior, o Batman, considerado a maior liderança do CV mato-grossense fora da prisão. Suas condenações somam 49 anos, dos quais 35 ainda restam a cumprir. Em setembro, ele recebeu progressão para o semiaberto, com uso de tornozeleira eletrônica — que rompeu poucos dias depois.
O Gaeco pediu a regressão do regime após a fuga. Segundo a Promotoria, Batman atua em diversos ramos criminosos, incluindo tráfico, extorsão e jogos de azar. Em julho, ele escapou de uma operação policial na casa do rapper Oruam, filho de Marcinho VP, uma das principais lideranças do Comando Vermelho nacional.
Outra foragida é Angélica Silva Saraiva de Sá, a Angeliquinha, 34 anos, condenada a mais de 250 anos de prisão por homicídio, ocultação de cadáver e organização criminosa. Ela é tida como a chefe do CV no norte do estado e teria ordenado a execução de quatro paranaenses suspeitos de ligação com o PCC.
Também fugitiva, Jéssica Leal da Silva, conhecida como Arlequina, 36, é apontada como líder da facção em Juína, a 735 km de Cuiabá. Responde a dezenas de processos por tráfico, tortura e homicídio, e é suspeita de comandar os chamados “tribunais do crime”.
As duas fugiram juntas da Penitenciária Feminina Ana Maria do Couto, em Cuiabá, no dia 17 de agosto, após serrar as grades da cela. O Gaeco acredita que ambas buscaram abrigo no Rio.
O promotor Adriano Alves afirma que o maior desafio é o controle dentro das prisões. “Prender é fácil. O difícil é impedir que continuem mandando de dentro da cadeia. Eles recebem visitas um dia sim, outro não, e seguem operando normalmente”, disse.
Ele ainda destacou que nenhum dos mortos na recente megaoperação policial no Rio tinha ligação com Mato Grosso. “Rafael de Moraes Silva apenas nasceu no estado. Não vivia aqui. Nenhuma liderança nossa foi morta nessa operação”, concluiu.
As investigações indicam que, no início de outubro, parte do grupo trocou de esconderijo. Um dos locais usados seria a área conhecida como Fazendinha, próxima à praia, na região da Barra da Tijuca.