Na semana passada a imprensa nacional fez uma ampla cobertura sobre o embate político e jurídico entre o Presidente da República e o Congresso Nacional quanto a questão que envolve a majoração das alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras, o IOF.
Por certo, a sequência de notícias fez parecer capítulos das novelas de outrora, quando realmente mobilizava o país para acompanhar as referidas tramas.
Em síntese, diferente da ficção, a realidade é que o Presidente da República aumentou através de Decreto as alíquotas do referido imposto, sem contudo, passar pelo Congresso Nacional.
A justificativa do Presidente da República é no sentido de que a Constituição Federal lhe autoriza alterar as alíquotas do IOF mediante simples Decreto.
Porém, tal regra apenas se aplica na hipótese do referido imposto ter o caráter regulamentador do mercado, tal qual para evitar concorrência desleal ou para fazer uso do princípio da reciprocidade em face de barreiras fiscais adotadas por outros países.
Contudo, nas próprias razões de motivos do Decreto Presidencial, o aumento da carga tributária tem apenas o caráter fiscal no sentido de incrementar a arrecadação, hipótese que demandaria a necessidade de lei em sentido formal, quer dizer, passar pela análise do Parlamento.
Não por isso o Congresso Nacional editou um Decreto Legislativo anulando o Decreto Presidencial, cuja regra também está prevista na Constituição Federal, que por sua vez, atribui ao Poder Legislativo a competência exclusiva para sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem o poder regulamentador.
Portanto, trata-se de instrumento fundamental do sistema de freios e contrapesos inerente ao Estado Democrático de Direito, concebido com a finalidade de resguardar a competência legislativa primária do Poder Legislativo, em linha com o Princípio da Separação de Poderes.
Nesse sentido, a alteração das alíquotas do IOF por decreto e com vigência imediata somente tem cabimento quando necessária para atender objetivos relacionados à política monetária, cambial e fiscal, conforme estabelecido na legislação federal.
Por certo, a graduação de tributos por razões meramente arrecadatórias deve observar o devido processo legislativo, com a edição de lei pelos representantes do povo, observada a anterioridade do exercício e/ou de noventa dias dos fatos geradores, conforme o caso. Daí a excepcionalidade da atuação do Poder Executivo, em matéria de alíquotas do IOF.
No caso em questão, o Congresso Nacional demonstrou que a majoração das alíquotas do aludido imposto promovida pelo Governo Federal se escora em interesses essencialmente arrecadatórios, como se verifica no Parecer de Plenário das Comissões de Finanças e Tributação, e de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados.
Sendo assim, considerando que o aumento de arrecadação não é um motivo legalmente admitido para o Executivo aumentar alíquotas do IOF, o Parlamento agiu corretamente ao sustar o decreto que assim procedeu, de modo a preservar a sua competência normativa.
Agora a última palavra sobre o assunto caberá ao Supremo Tribunal Federal, que por sua vez, já foi provocado para dirimir a questão.
Enfim, além de tratar de assunto meramente jurídico, a discussão como não poderia deixar de ser, descambou também para o campo político.
Victor Humberto Maizman é Advogado e Consultor Jurídico Tributário, Professor em Direito Tributário, ex-Membro do Conselho de Contribuintes do Estado de Mato Grosso e do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais da Receita Federal/CARF