Nas festas de fim de ano, a mesa se transforma em ponto de encontro. É ali que histórias são contadas, memórias são recriadas e afetos são servidos junto com os pratos. Mas, em meio a rabanadas, assados e brindes, surge uma pergunta silenciosa — e necessária: é possível celebrar sem adoecer o corpo?
Sim. E mais do que possível, é urgente rever a forma como se enxerga a relação entre prazer e saúde. O corpo não é inimigo da festa. Ele apenas pede respeito.
A ciência já demonstrou que alguns alimentos, quando consumidos em excesso e de maneira contínua, podem favorecer processos inflamatórios associados ao desenvolvimento do câncer. Carnes processadas, embutidos, frituras, ultraprocessados, açúcar em excesso e álcool sem moderação se comportam como convidados indesejados: chegam sem aviso e deixam marcas.
Mas a ceia não precisa ser um campo minado. Pelo contrário. Ela pode — e deve — ser um gesto de cuidado. Pratos coloridos, frutas, legumes, castanhas, grãos, azeite de oliva e proteínas mais leves transformam a mesa em um verdadeiro ritual de proteção. Uma alimentação consciente não retira o prazer da celebração — ela o estende no tempo.
Para quem enfrenta o câncer ou já atravessou esse caminho, o recado é ainda mais potente: a doença não cancela o direito à alegria. O diagnóstico não deve silenciar risos nem impedir encontros. O tratamento cuida do corpo; a celebração cuida da alma. Adaptar a alimentação, respeitar limites e manter o acompanhamento médico são atitudes de responsabilidade — nunca de renúncia à vida.
O brinde, aliás, também pode ser simbólico. Menos quantidade, mais intenção. Um gole consciente vale mais do que o excesso vazio. O mesmo vale para a comida: não se trata de proibir, mas de escolher. Não é sobre culpa, mas sobre consciência.
As festas de fim de ano não exigem perfeição. Exigem presença. E presença começa ao ouvir o próprio corpo, compreender seus sinais e tratá-lo como aliado. O câncer não nasce de uma ceia. Ele se constrói ao longo de hábitos repetidos.
Celebrar, portanto, vai muito além do prato. É decidir viver com mais equilíbrio, mais informação e mais afeto. É compreender que saúde não é ausência de prazer, mas a possibilidade de vivê-lo por muitos anos.
Que o Natal e o Ano Novo sejam marcados por mesas cheias de cores, brindes conscientes e encontros verdadeiros — e que 2026 chegue como um ano de esperança, cuidado e vida.
Dr. Wilson Garcia é Médico mastologista e cirurgião oncológico